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Jornal DIÁRIO DO NORDESTE
Domingo - 07-07-2019
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Sentidos da Vida: projetos permitem acessos de pessoas com deficiência a expressões artísticas


Em busca de democratizar o acesso à arte em Fortaleza, iniciativas se dedicam a tornar acervos e apresentações cada vez mais disponíveis a pessoas com deficiência visual, auditiva e autismo

Foto do Jornal Diário do Nordeste
Fotografias táteis são desenvolvidas por projeto inovador na
Universidade Federal do Ceará

Presenciar a descoberta de algo até então fora da realidade, parece uma experiência única de se viver. Em Fortaleza, diversos projetos se propõem a ser espaço de troca e conhecimento para possibilitar a pessoas com deficiência o acesso à arte.

No Museu da Fotografia Fortaleza, cegos podem ver imagens com as mãos. Na Associação Fortaleza Azul, crianças com autismo redescobrem os movimentos por meio da dança. No Dragão, cegos e surdos podem visitar exposições com intérpretes e legendas em braile. E, enquanto isso, no próprio Instituto dos Cegos, estudantes vivenciam a música como algo novo.

Pelas pessoas tornando essas realidades possíveis e pelos imersos em projetos como esses, um questionamento é feito: quais as políticas necessárias para tornar a arte cada vez mais acessível? A resposta parece estar nas iniciativas.

Ver e sentir

Se o contato com a fotografia era algo inalcançável na imaginação dos que não possuem o sentido da visão, a tecnologia se mostra capaz de superar as barreiras da deficiência.

No Campus do Pici da Universidade Federal do Ceará, alguns instrumentos e ideias tornaram realidade as cenas registradas em papel fotográfico serem algo para todos.

"Nosso desejo principal é formar um grupo de fotógrafos cegos", explica o professor de Design da UFC, Roberto Vieira, precursor do movimento dentro da universidade. Segundo ele, tudo começou no fim de 2014, quando recebeu uma ligação inesperada.

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Peças táteis das fotografias são desenvolvidas pelo
projeto

"Eu ainda não era professor da UFC na época. Recebi um telefonema do Instituto dos Cegos para fazer uma doação na arrecadação de quantia para comprar bengalas para crianças cegas no interior. Foi aí que comecei com a reflexão nessa área. Sou fotógrafo amador e logo depois de ter conversas sobre isso, comecei a pensar em tornar a fotografia viável para eles", relembra.

Após saber da existência de uma oficina digital que permitia a materialização de imagens realizada na universidade, ele começou a formular os princípios do projeto. Desde então, alunos e voluntários se uniram para realizar as atividades básicas propostas e, ainda em 2015, ele foi oficializado em edital da Secult Arte.

"Hoje, trabalhamos com o processamento de imagens por meio da programação, fazemos a materialização desse trabalho e experimentações para tornar a fotografia tátil possível para aqueles que não enxergam", diz o professor.

Com a estabilidade, neste ano a parceria com o Museu da Fotografia proporcionou um passo maior: montar a turma e realizar aulas sobre princípios da fotografia, em 11 encontros. "Nessas reuniões, nós discutimos o conceito de arte, o que é a fotografia enquanto arte, o que torna uma foto bela, quais as regras de composição no momento de fotografar", ressaltou o professor.

Para os alunos, reunidos no encerramento das aulas da primeira fase nos últimos dias de junho, o sorriso no rosto e as conversas animadas transpareceram o quão importante foi a iniciativa e a formação.

Carlizete Campos tem 45 anos e é uma das integrantes das aulas, além de atendida pelo Instituto. Para ela, a autonomia adquirida foi o grande ganho a partir da formação. "Foi uma experiência muito inovadora e até o momento eu ainda não tinha tido o contato com a arte de fotografar. É algo tão comum nas nossas vidas, né? Essa vontade de registrar nossos melhores momentos e situações importantes. Agora, quando escuto algo sobre, me sinto à vontade para participar", diz.

A servidora pública perdeu a visão ainda entre os seis e oito anos. Desde então, vê apenas luzes e alguns vultos, o que ajuda na hora da locomoção. Para ela, a arte passou a ser uma forma de se libertar.

Sons e leitura

No âmbito da música não falta esforço, pelo menos no que depende dos projetos encabeçados pela Sociedade de Assistência aos Cegos, local que mantém uma escola, Instituto Hélio Góes, além de um hospital e clínicas oftalmológicas.

O 'Visão Musical', coordenado por Paulo Roberto Cândido e Ivo Moutinho, busca incluir culturalmente os alunos cegos ainda em fase de reabilitação.

"Formamos o projeto em 2017 e já nos apresentamos no Dragão do Mar, inclusive. Uma das nossas produções foi o disco 'Fisiodrama', com canções autorais que falam sobre essa questão da inclusão e da sociedade", afirma Paulo, que hoje é coordenador dos projetos no Instituto, espaço conhecido após passar por um processo de perda de visão.

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No Instituto dos Cegos, a música é uma das formas de
acessar a arte

Nos passos

Também no caminho rumo à acessibilidade, grupos como a Associação Fortaleza Azul (Faz), que auxilia crianças autistas e familiares, o entusiasmo pela arte parece engrandecedor dentro de trajetórias difíceis, mas muito bonitas.

Para os autistas, por exemplo, uma das dificuldades cotidianas está relacionada a movimentar-se. Daniela Botelho, presidente da Associação, conta que as reflexões sobre isso resultaram na vontade de trazer a dança para essa equação.

A Faz recebeu um convite da Academia Rossana Pucci e, hoje, já são 12 crianças com autismo atendidas pelo projeto. Segundo Daniela, além de acessar a arte e imergir nesse universo, a ação tem dado resultados diretos na saúde.

"Eles trabalham esse envolvimento do corpo, da imitação. Como são bastante agitados, é necessário trabalhar esses comandos. Tem criança que entrou sem conseguir subir uma escada, pegar uma bola, e começou a trabalhar esse reconhecimento do corpo".

Até então, quem auxilia no comando do ação é a própria dona do estúdio, Rossana Pucci. A idealização vem de muito tempo, surgiu em 1995 sob a perspectiva de contribuir no processo do desenvolvimento psicomotor, social e afetivo dos que vivem com a doença.

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Associação Fortaleza Azul desenvolve trabalho de dança
com crianças autistas

"A dança por si só, já é uma atividade de inclusão principalmente no que se refere ao funcionamento e desenvolvimento global. Ela permite que os portadores de Transtorno do Espectro Autista (TEA) desenvolvam suas potencialidades tanto no campo social quanto no comportamental, psicológico e físico".

Atualmente, são 12 crianças atendidas. "Seria maravilhoso que mais pessoas pudessem se engajar nesta linha de pensamento. Acresceria na melhora dos pacientes e na degradação física e também promoveria o convívio social que lhes é de direito", opina Rossana.

Exposições

Enquanto isso, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura passou a implementar, desde o fim do ano passado, algo aparentemente simples nas exposições fixas do Museu da Cultura Cearense (MCC): mostras com intérpretes e educadores surdos. Segundo o local, foram disponibilizados textos em Braille e ampliados, audiodescrição, vídeo de libras, obras táteis e mediação especializada para todos os grupos. No momento, a exposição "Memórias que não escrevi", de Sebastião de Paula, está em cartaz.

Nesse meio tempo, fica com urgência a necessidade e os pedidos por algo que deveria ser básico. Se a arte é para todos, a esperança é para que tomem forma os dias nos quais as limitações não sejam empecilhos para o conhecer e encantamento, seja pelas telas, coreografias e muito mais.

Serviço

Museu da Fotografia

De quarta a domingo, das 12h às 17h, na Rua Frederico Borges, 545, Varjota. Gratuito. (3017.3661)

Museu da Cultura Cearense

De terça a domingo, a partir das 9h e às 14h no fim de semana, na Rua Dragão do Mar, 81, Praia de Iracema. Gratuito. (3488.8600)


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