Jornal DIÁRIO DO NORDESTE
Sexta-feira - 07-11-1986
Fortaleza - Ceará - Brasil
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TRANSPLANTE, A ÚLTIMA ESPERANÇA DE VIDA
Córnea, a visão através de uma cirurgia simples


   O transplante de córnea é, talvez, o mais antigo na história da medicina. Há 115 anos, era realizada a primeira cirurgia de transplante de córnea, mas só na década de 40, foram obtidos os primeiros resultados positivos. Vinte anos depois, quando tiveram início os primeiros transplantes de órgãos, a cirurgia com a córnea já havia atingido um estagio em que os transplantes passaram a ser uma rotina.

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   Hoje, no Brasil, não se tem uma estatística exata do número de pessoas que enxergam graças a um transplante de córnea. No Ceara, o número é alto, mas como a cirurgia já é feita em vários hospitais, não existe um levantamento atual de quantos transplantes já foram feitos. Atualmente, só na lista de espera do Instituto dos Cegos, 30 pessoas aguardam uma córnea. O número de receptores em todo o Brasil é alto, tanto que quando morre um doador, na maioria das vezes, as córneas retiradas, beneficiam a duas pessoas cegas.
   A técnica do transplante de córneas já está completamente dominada. Após a morte do doador, a córnea pode ser retirada até seis horas depois, mas não é aconselhável que passe de quatro, segundo o Dr. Waldo Pessoa de Almeida, do Instituto dos Cegos, que já realizou inúmeras cirurgias de transplante de Córnea. Nesse tipo de transplante, é tudo bem mais simples. Não existe o problema da rejeição, apenas a questão da maior ou menor compatibilidade, ou seja, a córnea de um doador idoso vai ter melhor aproveitamento se transplantada para receptor idoso.

BANCO DE OLHOS

   Para se fazer um transplante de córnea hoje, é necessário apenas a doação. Fortaleza já conta com dois Bancos de Olhos: um no Instituto dos Cegos e outro no Pirambu. Os dois recebem doações. Até o final deste ano, vai estar em funcionamento o Banco de Olhos do Ceará, no IJF, através do convênio do Hospital, Instituto dos Cegos e Sociedade de Oftalmologia do Ceará. O Banco será uma espécie de Centro de Informações, que vai armazenar todos os dados relativos a doações a pacientes em condições de receber um transplante. Também vai contar com um plantão constante de um oftalmologista e sempre que houver a notícia de uma doação, ele vai até o local e faz a retirada.
   A retirada da córnea é rápida. Não leva mais que trinta minutos até que o médico recomponha esteticamente o cadáver. Essa córnea que foi retirada pode ser preservada até 30 dias em meio especial. Uma das funções do Banco de Olhos do Ceará será cuidar ,da conservação até que seja preparado o receptor.
   A córnea, como um dos órgãos mais simples de ser transplantado, é o que apresenta mais doadores. O Banco de Olhos do Instituto dos Cegos conta com um número considerável de pessoas que fizeram doações. O Dr.Waldo Pessoa diz que não existem escrúpulos nas pessoas em fazer doações, "o que há é a falta de lembrança. Nos mentos, difíceis, os familiares não lembram de doar. É ai que se torna necessário um trabalho de conscientização de médicos, enfermeiras e. assistentes sociais, para lembrar a família que ela pode doar, para salvar outras, vidas".

QUALQUER PESSOA

   Qualquer pessoa pode fazer doação de córnea, mesmo aquelas que têm problema de vista, e sempre haverá ,um receptor preparado, porque como explica o Dr. Waldo, a córnea não é irrigada, então fica afastado o problema da rejeição. Ele informa que em caso de urgência, já se tem ido buscar córnea no Banco de Olhos de São Paulo. “E o caso de acidente, com perfuração de olho. O Banco de São Paulo tem ajudado muito. Lá a conscientização maior e sempre existe uma córnea para socorrer nesses momentos”.
   Há pouco mais de um mês um professor de matemática de 32 anos, morreu na Casa de Saúde São Raimundo, de infarto no miocárdio. Uma semana antes de morrer havia doado as córneas ao Banco de Olhos do Instituto dos Cegos. A beneficiada com uma das córneas foi Marlene da Silva, 23 anos, mãe de três filhos. Marlene ainda não havia se recuperado totalmente da cirurgia, feita pelo Dr. Waldo, e estava insegura sobre se voltaria mesmo a enxergar. Ela conta que fazia tempo que esperava e estava em casa, no Bom Jardim, quando recebeu a notícia de que as córneas haviam chegado. A cirurgia foi feita imediatamente.

TEMPO HÁBIL

   Segundo o Dr. Waldo Pessoa, os transplantes de córneas quase sempre são bem sucedidos e o ideal é que a cirurgia seja feita em tempo hábil, mesmo que se tenha condições de conservar a córnea até 30 dias. O beneficio de transplante de córnea é grande, mas gostaria de lembrar que é preciso prevenir as causas da cegueira, diz o Dr. Waldo, acrescentando que apenas pode voltar a enxergar através de um transplante de córnea, quem é portador de cegueira corneana.
   Os outros tipos de cegueira não são resolvidos com transplante. Para quem convive diariamente com os 80 internos do Instituto dos Cegos, o Dr. Waldo conta que é uma realidade triste, porque eles ficam com a mania de examinar os olhos, na esperança de um dia receber a notícia de que vão voltar a enxergar se fizer a cirurgia. Mais sério do que essa expectativa é a denúncia que fez o médico: "é crescente o índice de cegueira, principalmente a cegueira carencial. A cada ano aumenta o número de crianças com idade entre 10 e 12 anos que ficam cegas, pela falta de consumo de leite, proteína e carne".
   "Embora existam outras causas para a cegueira, a mais expressiva é a falta de defesa pela carência alimentar. Agora é que estão aparecendo os resultados desses anos todos em que não houve nenhum plano de saúde para a população, tanto a Secretaria de Saúde como a de Educação têm planos de prevenção, que não são executados.

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"É crescente o índice de cegueira, principalmente a cegueira carencial. A cada ano aumenta o número de crianças com idade entre 10 e 12 anos que ficam cegas completamente pela falta de consumo de leite, carne e demais proteínas. a Secretaria de Saúde como a de Educação têm planos de prevenção da cegueira, mas não são executados. E o que vemos é o aumento significativo de crianças cegas."

Dr. Waldo Pessoa de Almeida


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