Jornal O POVO
Quarta-feira - 27-12-2006
Fortaleza - Ceará - Brasil
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OPINIÃO
O pranto dos bengalas brancas
ARTIGO
Blanchard Girão
Eram centenas, milhares talvez, de pessoas no
adeus a Waldo, na indignação e na dor de uma cidade diante de mais um ato da violência
imperante.
No velório, em meio ao murmúrio sofrido da multidão, o
silêncio de um grupo de cegos traduzia a mais solidária das mensagens ao benfeitor que
partia. Waldo Pessoa foi, por várias décadas, o anjo tutelar dos deficientes visuais da
nossa terra. Ele se entregava, tempo integral, do amanhecer até tarde da noite, para dar
àquelas criaturas, ferreteadas pela natureza com o negro e eterno manto da ceguidão, a
consciência de que havia no mundo um espaço amplo para que pudessem caminhar
confiantemente, com a auto-estima elevada, sua dignidade assegurada.
Crianças, adultos, idosos, encontravam na Sociedade de
Assistência aos Cegos, desde os primitivos dias de Hélio Góes Ferreira - seu fundador -
o amparo devotado, carinhoso e profundamente humano de Waldo Pessoa.
Fortaleza, aparentando indiferença, sabia, entretanto, da
grandeza do trabalho ali desenvolvido sob a liderança desse abnegado que a mão feroz de
um facínora subtraiu estupidamente à vida. E por isso a cidade chorou sua partida,
prestando-lhe uma consagração póstuma poucas vezes vistas entre nós.
Nenhuma das homenagens se comparou, por certo, àquela lágrima
que eu vi rolar dos olhos cinzas de um dos muitos assistidos por Waldo silenciosamente
postados em derredor do ataúde coberto de flores.
Waldo foi embora. Mas lá ficou a sua querida Sociedade de
Assistência aos Cegos com sua viúva Josélia, com seus filhos, e o grupo de devotados
seguidores da sua obra. E os que não têm luz; e também os que, por suas mãos, passaram
a rever as cores da vida, jamais o esquecerão. Um grande homem não morre. Permanecerá
para sempre na lembrança de sua gente.
Os sinos destes Natal repicaram mais tristes em sua memória.
Blanchard Girão é jornalista e articulista do O POVO
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