Jornal O POVO
Domingo - 14-01-2007
Fortaleza - Ceará - Brasil
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Homenagem
Francisco Waldo Pessoa de Almeida
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1937 - 2006 In Memoriam
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Conheci o Dr. Francisco Waldo Pessoa
de Almeida quando buscava viabilizar um projeto oftalmológico em São José dos
Campos - SP para deficientes visuais. Um amigo paulista nos apresentou e a
empatia foi imediata: eu, inexperiente em projetos desta natureza, cheguei com o
meu discurso formal pronto: "Dr. Waldo, gostaria de viabilizar um projeto para
deficientes visuais carentes..." Ele (Waldo) me cortou na hora: -"Minha filha -
disse ele - você vai viabilizar um centro de excelência para deficientes visuais
- não discrimine as pessoas duas vezes, uma por ser cega e outra por ser
carente". Estava dada a primeira lição, que levarei comigo para o resto da
minha vida.
Meu aprendizado começou a partir desse instante, conhecendo o trabalho liderado
por esse médico extraordinário e sua equipe. Um Instituto para Deficientes
Visuais Modelo. O Dr: Waldo me ensinou tudo o que sei sobre projetos
auto-sustentáveis: - "Dessa forma, o Instituto não dependerá de doações, hoje
certas, amanhã incertas, para funcionar plenamente". Outra lição importante. "De
certa forma, todos somos deficientes, pois quem não usa plenamente todo seu
potencial, esta atrofiando suas próprias capacidades". Ele me ensinou que todos
somos capazes de alguma coisa, e que a pior limitação é o preconceito sobre
nossas limitações. A hospitalidade arrebatadora dele e sua esposa Josélia já me
renderam um sem números de amigos no Ceará. Claro que o Dr: Waldo abraçou nosso
projeto, viajou a São Paulo para nos ensinar a aprimorar o que de início
imaginávamos impossível. Viabilizou-se assim, uma parceria com uma ONG
internacional que resultou na construção de dois Centros Cirúrgicos Modelo, em
funcionamento até hoje, com a marca dele: na sala de espera do Instituto
Paulista, uma frase que ele e D. Josélia repetiam incansavelmente: "Os que fazem
estão sujeitos a errar, os que nada fazem, estão constantemente errados".
Um Tempo depois, um problema de saúde o levou a São Paulo. E quis a Divina
Providência que eu pudesse doar sangue a ele. Estabeleceu-se então o "vínculo
oficial" entre nós, e ele sempre me tratou como filha. Eu o admirava tanto
quanto o amava, mas nunca disse isso a ele. Hoje acredito que ele finalmente me
ouve - mas calado. Há trinta dias que calaram a tua voz, Waldo, porém o teu
legado é de enorme responsabilidade: "A responsabilidade dos que vêem, quando
outros não enxergam" - frase de Saramago que ele repetia sempre - Tua obra
permanecerá viva nos que te conheceram. Você mudou profundamente a minha vida, e
tenho certeza, a de muitos outros. Nem a dor física te afastou da missão,
verdadeiro apostolado, de tirar o cego da rua. E em complemento ao que você me
ensinou, digo:
"Os que fazem, estão sujeitos a errar:
serão criticados, invejados, desprezados - até mortos. Os que nada fazem, mesmo
quando têm poderes conferidos e responsabilidades assumidas, estão
constantemente errados, e mesmo vivendo cercados por seguranças, circulando em
veículos blindados, morrerão inúteis, esquecidos, sem lamentos."
Mas a tua obra, Waldo, não será esquecida,
permanece viva naqueles que se beneficiaram do teu trabalho, dos que aprenderam
com ele, dos que viveram ao teu redor e que contarão tuas histórias às novas
gerações, E assim na Fé de que agora estás com Deus em nossos corações, nunca
morrerás.
Marcela Bragatto
São Paulo, Janeiro de 2007
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