Jornal O POVO
Quinta-feira - 11-08-2011
Fortaleza - Ceará - Brasil
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Em busca da socialização
Inclusão educacional deve atender todas as
crianças com deficiência?
Comunidade surda luta pela sobrevivência das escolas bilíngues e por mais
inclusão social
No princípio, a
deficiência auditiva não impediu a estudante Vânia Maria dos Santos, 15,
de frequentar a escola regular. Até o nono ano, ela se esforçava na sala
para compreender a matéria explicada pelo professor sem intérprete. “Eu
escuto um pouco e fazia também leitura labial. Na dificuldade, a gente
vai descobrindo estratégias para seguir nos estudos”, desabafa a menina. |
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Para a
comunidade surda, a inclusão educacional não pode ser generalizada. Eles alegam
que o surdo utiliza uma comunicação própria, através da linguagem oficial de
libras, e que deve ser respeitada. Em maio, uma passeata, seguida por audiência
pública na Assembleia Legislativa, pediu respeito à educação e cultura surda.
Eles reivindicavam as mudanças propostas no Plano Nacional de Educação (PNE),
que institui a integração dos surdos nas escolas comuns.
A professora de libras Débora Vasconcelos atenta
para a metodologia diferenciada para os surdos. “Na escola especial, o aluno faz
a prova escrita e uma avaliação global, baseada no visual”, detalha. Ela
acredita que inseridos em um mesmo ambiente, os surdos podem avançar no
aprendizado sem constrangimentos.
O professor de química Silvio Gentil lembra da
primeira vez que enfrentou o desafio da inclusão educacional. O aluno era surdo
e não existia interprete na sala de aula regular. Na graduação, ele teve apenas
uma disciplina de libras, que considerou insuficiente. “Eu tinha que fazer
muitos gestos para o aluno surdo conseguir entender a matéria. Os outros alunos
acabam prestando mais atenção nos gestos das minhas mãos do que no conteúdo”,
diz. O jeito foi dividir a aula em dois momentos: os 30 primeiros minutos eram
para os alunos regulares e os 20 minutos restantes eram destinados ao aluno
surdo.
Outras deficiências
Para a coordenadora do Instituto Hélio Góes, Kássia Aquino, a inclusão educacional para os alunos com deficiência visual
seria possível se a escola regular contasse com todos os recursos disponíveis.
“Somos a favor de uma inclusão justa, séria. Não adianta só o aluno ser inserido
na escola. O professor também tem que se sentir incluso nessa nova realidade”,
opina. O Instituto surgiu em 1942, como pioneiro na educação para cegos.
Para ela, o professor não precisaria saber
braile, mas sim compreender as necessidades dos alunos. É importante que a
didática seja voltada para todos, com livros em braile e várias opções de fontes
das letras. “A inclusão educacional é possível desde que as demandas dos alunos
sejam atendidas, com recursos e material didáticos adequados e profissionais
especializados”, ressalta.
ENTENDA A NOTÍCIA
Comunidade surda é contra as mudanças na política
nacional de educação, que prevê a inclusão educacional dos surdos. Eles defendem
que a educação dos surdos seja feita em uma escola bilíngue, para ter acesso
pleno à sua língua materna (libras) e conseguir interagir melhor em sociedade
RESUMO DA SÉRIE
Durante três dias, O POVO discutiu os desafios da
inclusão educacional. O período pós-alfabetização é considerado o mais crítico
para crianças com deficiência. Professores aprendem na prática a lidar com as
diferenças. O número de disciplinas obrigatórias relacionadas ao tema na
graduação é insuficiente. Sensibilidade para perceber os limites, plano
pedagógico adequado e respeito são fundamentais nesse processo de inclusão.