Jornal O POVO
Segunda-feira - 24-06-2019
Fortaleza - Ceará - Brasil
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Forró pra todo lado
| Natan do Acordeom | Com dois deficientes visuais no comando, grupo de forró aproveita o período de São João para levar a tradição a muitos palcos da Cidade
Natan Batista e Leandro de Castro se conheceram na adolescência, quando foram internos na Sociedade de Assistência aos Cegos. Além da deficiência visual, os dois têm em comum o amor pela música e, com outros dois amigos que enxergam, formaram o grupo de forró pé-de-serra Natan do Acordeom. |
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Já Leandro de Castro teve um processo diferente. Ele nasceu em Baturité, a 93 km de Fortaleza. Aos 5 anos de idade foi diagnosticado com glaucoma e ficou completamente cego aos dez. "No meu interior tinha um rapaz que sabia tocar violão. Comecei a aprender com ele e tocávamos juntos, mais por diversão", diz. Aos 15 anos, veio estudar no Instituto de Cegos, em Fortaleza, onde conheceu Natan. "Estudamos juntos por algum tempo e, desde então, somos amigos".
A amizade dos dois resultou em uma parceria profissional, quando Natan, há oito anos, convidou Leandro para integrar seu grupo musical. "Um dia estava em casa quando o Natan chegou, me convidando para cantar no grupo dele, porque o cantor da época havia saído e ele já tinha algumas apresentações marcadas. Montei um repertório de aproximadamente 30 músicas e fui ajudá-lo. Desde então, continuamos juntos".
O grupo Natan do Acordeom foi criado há dez anos "por acaso", como lembra o músico. "Aprendi a tocar teclado sozinho, por curiosidade mesmo. Um dia o sanfoneiro da banda que eu participava faltou e, por falta de outro, tive que assumir o posto. Acabei gostando e resolvi aprender a tocar sanfona também. Depois de um tempo, o grupo acabou e decidi montar um outro", conta.
No início, a maioria dos integrantes do grupo eram cegos. "Por mim teria mantido assim, mas a logística de um grupo formado somente por cegos é bem complicada, principalmente na hora de guiar todos e levar os instrumentos. Com o tempo, alguns foram saindo e ficamos só eu e o Leandro de cegos", explica. O fato de ser um grupo com integrantes cegos já gerou desconfiança por parte de contratantes. "Quando ligam para nos contratar, geralmente não falo que somos cegos. Um dia fomos contratados para tocar em um lugar tradicional de Pacatuba. Chegamos cedo, montamos tudo e, na hora marcada, o forró troou no meio do mundo. Depois da apresentação, a dona do local veio falar com a gente aos prantos, pedindo perdão. Fiquei sem entender, até que ela explicou que havia duvidado que nós éramos capazes de tocar. 'Quando vi essa ruma de cego chegando, quase bati no meu marido. Como você pôde contratá-los sem saber realmente se sabem tocar? Somos um local tradicional, com história. Se algo der errado, a culpa é sua'. Ela disse. Pediu desculpas e acabamos tocando lá por uns quatro meses seguidos", relata Natan.
Mesmo com novos gêneros musicais sendo incorporados às festas juninas como sertanejo e funk, Natan acredita que sempre haverá espaços para grupos de pé-de-serra. "Infelizmente o São João vem perdendo a identidade, mas as pessoas que vão para nosso show, ouvem o tradicionalíssimo forró pé-de-serra. Nosso repertório é formado pelo autêntico forró e, felizmente, ainda há quem gosta desse gênero", afirma.
A formação atual do grupo traz Natan Batista na sanfona, Leandro de Castro na voz e triângulo, Zairo Oliveira no zabumba e Francisco Aldemir, o Russo, no contrabaixo. "O público se admira bastante quando percebe que os meninos são cegos", afirma Zairo.
Com passagens em outros grupos regionais e de MPB, Zairo passou a integrar o grupo em 2019. "O Natan estava sem zabumbeiro e como eu já tinha experiência, ele me convidou para participar do grupo".
Já Francisco Aldemir, que é chamado pelos colegas de Russo, aprendeu a tocar contrabaixo para ajudar o grupo. "Tocava guitarra, mas percebia que o Natan sempre tinha dificuldade para conseguir um baixista. Por isso resolvi aprender um novo instrumento", declarou. "Ele começou a tocar contrabaixo por necessidade minha, e realmente me ajudou muito. Hoje não temos problema para contratar um baixista," completa Natan.
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