Jornal O POVO
Sábado - 22-08-1981
Fortaleza - Ceará - Brasil
Educadores analisam situação do deficiente


    A rejeição inconsciente da família e a persistência dos preconceitos contra as pessoas deficientes são ainda os principais entraves a uma maior integração destas na sociedade, declaram educadores, psicólogos e demais profissionais que trabalham com excepcionais em Fortaleza. A escola segundo eles, assume um papel importantíssimo na transposição desses obstáculos, mas somente a aceitação natural da família pode contribuir para que a integração se de num processo mais amplo e rápido, declaram.

Foto do Jornal O POVO
A escola importante papel na
integração do deficiente

    Ontem, com uma missa, às 18 horas, no Palácio da Abolição, oficiada pelo vigário da Catedral, padre Tito, foi aberta oficialmente, no Ceará, a Semana Nacional do Excepcional, dentro da programação do Ano Internacional das Pessoas Deficientes. O ato religioso reuniu dezenas de pessoas e representações de vários institutos voltados para a educação de deficientes. Estes, acompanhados por parentes, professores e amigos, formavam grade parte da assistência.

CONSCIENTIZAÇÃO
    A diretora do Instituto Pestalozzi, uma das mais tradicionais casas de educação de excepcionais de Fortaleza, Eunice Damasceno, declara que é necessária, antes de tudo uma conscientização a nível de família, para a aceitação do excepcional em todos os seus sentidos, não se envergonhando de expô-lo e dando-lhe todo o afeto que a sua carência exige.
    "Não vai nessa opinião uma censura aos pais e familiares de excepcionais ou deficientes de qualquer ordem", diz ela, acrescentando que "é sempre difícil e exige muita abnegação o acompanhamento do dia-a-dia de uma pessoa com tais problemas. Importante, todavia, é ressaltar que, somente após a família assumir o seu deficiente, é que a sociedade, ainda preconceituosa, passará assumi-lo."
    Diz Eunice Damasceno que os institutos que trabalham com excepcionais devem incluir no seu currículo educacional uma grande parte de tarefas que envolvam a participação dos pais, mesmo que o deficiente esteja em regime de internato. "Com isso, nós forçamos a participação da família no processo de integração do excepcional e promovemos uma conscientização da importância do seu papel na melhoria do seu padrão de convivência com a sociedade", explicou.

PRECONCEITOS
    A psicóloga da Clínica Miguel Couto, especializada no atendimento de deficientes motores, Roselita Furtado Figueiredo, acha que o preconceito da sociedade para com os deficientes físicos e mentais persiste numa escala bastante elevada. "Toda campanha publicitária que se tem feito pela televisão com a instituição do Ano Internacional das Pessoas Deficientes, não suste ainda os efeitos esperados, embora alguma coisa de benéfico já se possa antever como frutos dela", ressaltou.
    Segundo a Diretora do Instituto dos Cegos, Maria Neusa Fonteles Rocha, o sentimento que mais denuncia esse preconceito é o de pena, refletido num desejo de ajudar, como se o deficiente fosse incapacitado totalmente para viver em grupo, notadamente o cego. "Ora, nós sabemos que o deficiente visual, quando recebe o treinamento de locomoção necessário sabe ir e vir a qualquer lugar. Damos também treinamento profissionalizante, para integração do deficiente ao mercado de trabalho, e todas as outras coisas básicas para sua ação equilibrada no meio social onde vive.
    Atitudes de admiração e, às vezes de galhofa, assumidas por pessoas ignorantes, sem sensibilidade para com o problema, são, na opinião do professor Pedro Irismar de Alencar, do Instituto dos Cegos e de alguns colégios da rede privada da capital, outros pontos negativos a destacar com relação à integração dos deficientes na sociedade. Alencar, graduado para o ensino de Estudos Sociais, leciona também Matemática no Instituto, "só para ajudar", como ele próprio afirma. Ele é cego de nascença e recebeu seus rudimentos na mesma casa onde agora presta serviço.
    Segundo ele, o deficiente atravessa ainda uma fase precária com relação à sua aceitação pela sociedade. "As pessoas não acreditam na gente", declara, acrescentando que "por isso a discriminação e a marginalização surgem a todo instante, com todo mundo querendo nos ajudar, levando a se assumir um sentimento de auto piedade maléfico para a nossa convivência normal", analisa. É ele quem discorre ainda sobre a questão ao revelar que o isolacionismo natural a que o deficiente se impõe também constitui para que o seu processo de integração seja lento, dificultoso".
    Alencar declara, todavia que quando o deficiente resolve sair para enfrentar o mundo, ele sempre encontra, por parte das pessoas, uma boa vontade que pode até vir sob a forma de piedade. "Não importa, valendo mesmo somente a habilidade que se tem para saber como melhor usufruir dessa boa vontade". Diz ele nas escolas normais que frequentou, após a iniciação no Instituto dos Cegos, sempre foi bem visto e bem tratado por todos que passam a aceita-lo como elemento ativo no processo econômico-social, reforçando com isso a tese da naturalidade, que sempre defende com relação ao tratamento interpessoal. "Afinal, todos nós temos, numa escala maior ou menos, um pouco de anormalidade".

EDUCAÇÃO
    Ressaltando que a campanha do Ano Internacional das Pessoas Deficientes já surtiu efeitos benéficos, como a doação de mais de mil córneas e a oferta de quase duas dezenas de empregos somente para o estabelecimento que dirige, o Instituto dos Cegos, Neusa Fonteles acha, entretanto, que somente o binómio educação dirigida/conscientização familiar pode surtir, em tempo curto, os resultados almejados. "A influência social, de grupos mais numerosos de pessoas, vem a seguir, com base já feita anteriormente".
    A diretora do Instituto Pestalozzi, com 150 alunos em regime de internato e semi-internato, concorda com a opnião acima e acredita que somente a longo prazo a campanha publicitária em favor dos deficientes surtirá seus efeitos. "O povo em geral ainda não se sensibilizou para o problema, mas esperamos que chegue aos poucos a esse estágio", declarou.

Gincana em prol dos deficientes

    Os alunos do Centro Educacional professor Vicente Fialho - anexo à Funefor estão participando de uma gincana em beneficio dos deficientes.
    A Gincana ressalta a Semana do Excepcional e terminará ao próximo dia 28. Para divulgar a iniciativa estiveram, ontem, na redação do O POVO, os alunos Francisco Alves, Francisco José, Eliane Lima, Diana, Paulo Genúsia, Eliane, Eloísa, Amarildo e Elizabeth.


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