Jornal O POVO
Quinta-feira - 20-05-1999
Fortaleza - Ceará - Brasil
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Ceará - Falta estrutura para acolher visitante
Embora algumas medidas sejam tomadas para acessibilidade nas vias e transportes públicos, o Ceará ainda não está preparado para acolher o deficiente auditivo, visual e motor entre outros. A Prefeitura de Fortaleza instituiu quatro leis para facilitar a vida dos deficientes.
Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), 10% da
população mundial portam algum tipo de deficiência. No caso do Nordeste do Brasil
estima-se que este percentual seja um pouco mais elevado devido as condições sociais que
favorecem problemas como a desnutrição, paralisia infantil e casamentos consangüíneos,
entre outros. Só em Fortaleza devem existir por volta de 200 a 300 mil portadores de
deficiência. A cidade já possui Leis de Acessibilidade, mas ainda está despreparada
para receber e conviver com os deficientes. Confira as leis já instituídas em Fortaleza
e em seguida as dificuldades enfrentadas pelos deficientes motores, auditivos e visuais,
no dia-a-dia.
* Lei Municipal n° 8.149, de 30 de abril de 1998 - trata da acessibilidade dos portadores
de deficiência aos edifícios de uso público;
* Lei Municipal n° 8.147, de 28 de abril de 1998 - sobre a adequação e destinação das
unidades habitacionais em conjuntos populares construídos na cidade para famílias com
portadores de deficiência;
* Lei Municipal n° 8.244, de 18 de janeiro de 1999 - trata da adequação de unidades
autônomas de hotéis residências para portadores de deficiência;
* Lei Municipal n° 8.245, de 18 de janeiro de 1999 - trata da obrigatoriedade da
utilização do símbolo internacional de acesso onde tenham sido removidas as barreiras
arquitetônicas.
Problemas de locomoção
Ana Lucia Maciel, coordenadora do Departamento de Esportes da Associação dos Deficientes
Motores (ADM) e representante da Organização Nacional de Entidades de Deficientes
Físicos, seção Ceará, aponta como os maiores problemas para o turismo de deficientes
motores no Ceará a falta de um número adequado de rampas de acesso tanto no calçadão
como nos restaurantes da Beira-Mar e a falta de condições de tráfego na cidade em
geral, em especial no centro, cinemas e transportes coletivos.
Ana Maciel fez uma visita a vários hotéis da cidade para verificar a condição de
hospedagem de cerca de 240 pessoas, entre técnicos, atletas e pessoal de apoio do
Campeonato Norte/Nordeste de Basquete em Cadeira de Rodas, que por causa da falta de
condições dos hotéis locais, entre outros motivos, acabou se realizando em Recife, no
mês passado.
Apesar de alguns hotéis como Caesar Park, Marina, Seara e Othon possuírem as
adaptações necessárias, como elevadores, rampas, entradas e portas mais largas e
quartos com espaço suficiente para o giro completo das cadeiras de roda, entre outras, o
total de leitos não seria suficiente para hospedar a quantidade de atletas. Ana Maciel
ressalta que os equipamentos de lazer que a cidade oferece, em geral não levam em conta a
condição dos deficientes motores.
Sua queixa é confirmada pela arquiteta Virgínia Hatsue, que em 1994 fez o projeto de
graduação sobre uma residência familiar cuja dona de casa andava em cadeira de rodas.
Por causa da escolha, Virgínia teve que pensar em todos os detalhes da casa para que
estivessem ao alcance da moradora, especialmente a cozinha.
O interesse foi tanto que ela resolveu sentir na pele os problemas dos deficientes
motores. Só que desta vez fora de casa. Conseguiu uma cadeira de rodas e circulou por
vários pontos da cidade. O resultado foi desanimador. Poucos locais em Fortaleza
apresentam rampas e algumas não têm as inclinações adequadas ou possuem obstáculos,
como postes de sinalização.
Dificuldade de comunicação
Para Verônica Magalhães, presidente da Associaçãos dos Pais e Amigos dos Deficientes
Auditivos - Apada, que conta com cerca de 150 associados, o principal problema dos
surdos-mudos é a barreira da linguagem. "As barreiras arquitetônicas são mais
fáceis de serem resolvidas, basta um pouco de boa vontade. A barreira lingüística é a
mais difícil de ser superada", ressalta.
Não é preciso muito para constatar que Verônica tem razão. Não há intérprete da
Língua Brasileira de Sinais (Libras) nos hotéis, aeroporto, restaurantes, equipamentos
de lazer, hospitais e locais públicos ou privados. Só algumas igrejas evangélicas e a
católica, com a Pastoral do Surdo, possuem intérpretes desta língua que tem sintaxe e
gramática próprias.
Segundo a presidente da Apada a educação do deficiente auditivo está sendo prejudicada
pela falta da oficialização da língua de sinais e regulamentação da profissão do
intérprete. "Os que existem são por esforço próprio, porque querem ajudar".
Ela ressalta a necessidade do despertar da sociedade para a condição dos surdos-mudos.
"Eles vão a bancos, ficam doentes, precisam estudar, viajam e cometem delitos como
qualquer pessoa".
Senso de direção
Maria Josélia Almeida, presidente do Instituto
dos Cegos, afirma que entre outras adequações a cidade deveria possuir
nas avenidas principais semáforos com efeito sonoro; mais rampas, que auxiliam tanto os
deficientes motores como visuais e placas de informação em braile em elevadores, paradas
de ônibus e equipamentos de lazer em geral, como a que existe no McDonald's da avenida
Beira Mar.
No Instituto dos Cegos eles têm cursos de telemarketing, telefonista e reveladores de
radiografia, entre outros e em parceria com o Sebrae foi formada, no início do ano
passado, uma turma de 20 profissionais cegos para serem guias de turismo. "Eles têm
um senso de direção fantástico e as agências fazem sempre o mesmo percurso quando vão
fazer um city tour. Não são eles que vão dirigir e não são eles que vão ver o ponto
turístico, mas as pessoas não acreditam que eles podem apontar para o local sobre o qual
estão falando só pelo senso de direção".
Hotéis adaptam-se lentamente
Diante de todas as reclamações e ponderações feitas pelos representantes das
associações de deficientes o presidente da ABIH-Ce Iramar Veríssimo, em contato com a
reportagem de Turismo afirma que a legislação que obriga os hotéis e flats a terem dois
por cento de suas unidades habitacionais adaptadas aos portadores de deficiências
físicas é muito recente e aos poucos os hotéis estão se adaptando. Os prédios mais
novos têm a vantagem de já na construção poderem adaptar-se às exigências. Os mais
antigos porém, terão que fazer novos investimentos que ele considera necessários para
não perder mercado. Quanto à fiscalização do cumprimento das leis ele afirma que cabe
ao Estado o papel de punir, não à ABIH-CE.
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